A história do direito ao voto feminino no Brasil é uma verdadeira jornada de luta, resistência e transformação social. Muito além de uma simples conquista legislativa, o direito ao voto foi fruto de décadas de mobilização e coragem de mulheres que enfrentaram normas sociais, preconceitos e obstáculos políticos para garantir a participação feminina na vida pública.
Século XIX: Primeiros Movimentos e Questionamentos

No Brasil, a luta pelos direitos das mulheres ganhou força com Nísia Floresta, que leu e traduziu alguns escritos de Mary Wollstonecraft, além de ser uma grande defensora da educação feminina – um passo fundamental para a emancipação das mulheres.
A primeira Constituição brasileira, outorgada em 1824 por D. Pedro I, introduziu o conceito de cidadão ativo, ou seja, aqueles que podiam eleger representantes do governo local e do Parlamento. Mas havia um detalhe crucial: apenas pessoas livres tinham esse direito, excluindo a população escravizada, já que a escravidão só seria abolida em 1888.
Além disso, o sistema de votação seguia o sufrágio censitário, ou seja, o direito ao voto era condicionado à renda. Funciona assim:
- Eleições locais (paroquiais): podiam votar todas as pessoas livres, maiores de 25 anos e com renda anual mínima de 100 mil réis (ou bens no mesmo valor).
- Eleições para deputados, senadores e membros das assembleias provinciais: apenas os chamados cidadãos ativos, que tinham uma renda anual mínima de 200 mil réis (ou bens em valor equivalente), podiam participar.
Ou seja, além da exclusão racial, a participação política também era restringida pelo fator econômico, deixando grande parte da população – incluindo as mulheres – sem voz nas decisões do país.
A principal dúvida desse período era: “Será que a palavra CIDADÃO se referia apenas aos homens ou às mulheres também?” Isso porque o conceito de cidadão ativo e cidadão passivo veio da política francesa desde o final do século XVIII.
Nele, mulheres (e também crianças, loucos e outros) eram cidadãs passivas – ou inativas, segundo o vocabulário jurídico brasileiro. Elas usufruíam de direitos civis – e por isso podiam receber herança –, mas não podiam exercer opinião sobre assuntos políticos.
As mulheres e diversas outras pessoas não podiam votar porque não eram consideradas cidadãs ativas.
Isso é muito importante para que se entenda de onde surgem as sufragistas, ou seja, as mulheres a favor do direito ao voto feminino.
Veja abaixo a linha do tempo da luta pelo sufrágio feminino no Brasil, baseada no livro “O Voto Feminino no Brasil”, da historiadora Teresa Cristina Marques.
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Os primeiros movimentos
- 28 de julho de 1832 – Deputados como José Bonifácio e Manuel Alves Branco tentam propor um projeto para permitir que as mulheres chefes de família votem em eleições locais. No entanto, a proposta não avança.
- 1879 – Algumas mulheres brancas obtêm o direito de frequentar universidades.
- 9 de janeiro de 1881 – José Antônio Saraiva, o senador pela Bahia membro do Partido Liberal, assumiu a presidência do Conselho de Ministros em 1880, com o propósito de elaborar um projeto de reforma da legislação eleitoral e corrigir problemas nas contas públicas
- A reforma resultou no Decreto nº 3.029, de 9 de janeiro de 1881, que passou a ser conhecido como Lei Saraiva.
- Entre as medidas propostas estava o reconhecimento de títulos científicos – diplomas de medicina, direito ou odontologia, por exemplo – como comprovante da qualificação educacional do eleitor.
- 1887 – A dentista Isabel de Souza Mattos com base no art. 4º da Lei Saraiva, moradora de São José do Norte, na província do Rio Grande, solicitou e obteve o registro como eleitora.
- 1888 – O primeiro jornal feminista, A Família, de Josefina Álvares de Azevedo, surge abordando o sufrágio feminino e outras questões sociais importantes para as mulheres.
- 1890 – Quando o primeiro governo republicano convocou eleições para a Assembleia Constituinte, a doutora Isabel procurou a junta eleitoral com o documento registro de eleitora emitido em 1887, mas o juiz municipal de Rio Grande, José Vieira da Cunha, indeferiu a petição.
- “Não tomo conhecimento da petição que a este acompanha por não se dar a hypothese de que trata o artigo 1• §14, do dec. n.3022 de 7 de outubro de 1882, visto que a qualificação das mulheres não foi cogitada pela legislação em vigor, e é por ella implicitamente prohibida.”
- Outras mulheres disputaram o direito de voto, como Luiza Amélia Bemfica Ribeiro e Balbina de Castro Figueiredo, em Minas Gerais.
- 1891 – A Assembleia Constituinte debate o direito ao voto feminino, mas as propostas são rejeitadas, marcando o fim do século XIX sem mudanças efetivas.

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Os acontecimentos envolvendo Isabel foram um dos elementos incentivadores do movimento feminista no final do século XIX, inspiraram a comédia “O voto feminino”, em que Josefina Álvares de Azevedo ridiculariza a recusa masculina ao voto feminino e que inclusive futuramente foram citados por Leolinda Daltro em documento solicitando o sufrágio feminino enviado ao Congresso Nacional em 1916 e até lido pelo deputado federal Maurício Paiva de Lacerda. A peça foi encenada no teatro Recreio Dramático várias vezes.
Sobre esse tema, recomendo o livro Imprensa feminina e feminista no Brasil – XIX, de Constância Duarte.
Buscando assegurar a legitimidade do novo governo, os republicanos decidiram convocar uma Assembleia Constituinte. Três grupos de republicanos reuniram-se para elaborar pré-projetos de Constituição. O ministro da Justiça juntou os pré-projetos em um só texto, revisto pelo ministro da Fazenda, Rui Barbosa.
Esse projeto recorria ao termo “o eleitor” para designar o cidadão apto a votar, o que deixava no ar a antiga dúvida: mulheres poderiam ser consideradas cidadãs com direito ao voto?
Enquanto tudo isso acontecia, as sufragistas de A Família continuavam a fazer a campanha no jornal e a conversar com os deputados eleitos
Iniciados os debates da Assembleia Constituinte dos representantes dos 21 estados, os deputados Lopes Trovão, Leopoldo Bulhões e Casimiro defenderam que o direito de votar fosse estendido a mulheres diplomadas, desde que elas não fossem casadas.
Em dezembro de 1890, o deputado baiano César Zama, um veterano no Parlamento, discursou a favor da mesma causa. Em janeiro de 1891, Zama se aliou ao deputado Sá Andrade para apresentar uma emenda favorável ao voto das mulheres.
Ao mesmo tempo, Joaquim Saldanha Marinho apresentou emenda que propunha o sufrágio feminino em termos mais abrangentes que os da emenda de Zama e obteve a assinatura favorável de 32 constituintes.
Infelizmente, levadas a votação, ambas as emendas (Zama e Saldanha Marinho) foram rejeitadas.
Serzedelo Correia, argumentou que as mulheres não deveriam votar porque o exercício de direitos políticos “ameaçava seus delicados sentimentos”, bem como a “conservação da família”.
Lauro Sodré, apoiou-se no positivismo para argumentar que as mulheres deviam dedicar-se apenas à família.
É importante dizer que existem vertentes do positivismo, os adeptos do apostolado positivista, forma radical de adesão à filosofia de Augusto Comte, e a dos positivistas moderados, na linha do deputado gaúcho Júlio de Castilho.
Lacerda Coutinho argumentou que as mulheres não eram capazes em termos jurídicos porque não estavam sujeitas à convocação para lutar na guerra, a exemplo dos homens.
José Moniz Freire, argumentava que as mulheres não deveriam votar pois começaria a ter uma dissolução da família.
Joaquim Francisco de Assis Brasil publicou um livro no qual justificou sua posição contrária ao sufrágio de acordo com o viés liberal. Aparentemente ele se arrependeu da posição antisufrágio, pois participou da comissão de juristas encarregados de elaborar novas regras para as eleições e ele já estava convencido de que havia chegado a hora das mulheres votarem.
O texto final da Constituição de 1891 não deixou claro que as mulheres tinham o direito de votar, mas também não deixava claro sua proibição. Na dúvida, as juntas de alistamento eleitoral interpretaram literalmente a palavra “cidadão” como apenas o sexo masculino contida na Carta e, desse modo, rejeitaram os insistentes pedidos de alistamento eleitoral das mulheres.
Costa Machado, criticou as correntes políticas existentes entre os 268 Constituintes, os quais, a seu ver, foram responsáveis por rejeitar as emendas reivindicadas pelas sufragistas.
Início do Século XX: Surgimento de Movimentos Organizados

- 1910 – Leolinda Daltro, professora baiana, reuniu um grupo de mulheres para registrar em cartório uma agremiação política de nome Partido Republicano Feminino, cujos propósitos eram defender o sufrágio feminino e emancipar a mulher de todas as formas de exploração.
- O partido foi registrado em 17 de dezembro de 1910. Na capital federal, a agremiação passou a representar as sufragistas em audiências públicas com autoridades, em passeatas pelas ruas e em representações encaminhadas ao Legislativo.
- Leolinda Daltro encaminhou à Câmara representação em nome do Partido Republicano Feminino.
- No carnaval de fevereiro de 1917, Leolinda organizou um carro alegórico chamado O Voto Feminino, que saiu na agremiação dos Fenianos.
- 1916-1919 – Ativistas como Mariana de Noronha Horta e Leolinda Daltro fazem petições e reivindicações formais pelo direito de voto para mulheres. Parlamentares como Maurício de Lacerda e Alfredo Ellis também propõem projetos nesse sentido.
Assista o conteúdo do Mulheres na História sobre Leolinda Daltro clicando aqui.

A imprensa gostava de fazer charges satíricas sobre isso, a exemplo da publicada na revista semanal O Malho. Essas charges eram iguais as campanhas difamatórias anti-sufrágio que eram feitas na Inglaterra e que representavam homens nos papéis sociais de mulheres apenas porque o mundo ia virar de ponta cabeça.

Com a chegada da primeira guerra mundial, Leolinda começou a ensinar esgrima para as sufragistas. O recado da Leolinda para os políticos da época era muito claro: se tomar armas era condição para exercer o voto, as mulheres estavam dispostas a defender a pátria com coragem e empenho!
Bertha Lutz, era pacifista e tinha horror a qualquer forma de mobilização para a guerra.
Tanto Bertha como Leolinda defendiam o direito de voto das mulheres, mas discordavam de todo o resto, especialmente da forma como esse direito deveria ser conquistado.
Uniu-se a Jerônima Mesquita (cujo pai fora barão), a Maria Eugênia Celso (cujo avô fora conde), a advogada Mirtes Campos (a primeira a atuar em júris no Brasil), a professora Maria Lacerda de Moura, a engenheira Carmen Portinho e a escritora Stella Duval para criar a Liga para a Emancipação Intelectual da Mulher, no Rio de Janeiro.
Anos 1920: A Luta Ganha Força

Deputados e senadores continuaram a apresentar projetos de lei que previam o direito feminino ao voto, forçando o Legislativo a posicionar-se em relação às demandas das sufragistas.
- 1919 – Foram apresentados dois projetos desse tipo no Senado. Em maio, o senador Alfredo Ellis propôs projeto também nesse sentido, o qual foi rejeitado na Comissão de Justiça do Senado. Em dezembro, o senador pelo Pará Justo Chermont apresentou projeto parecido.
- 1921 – O deputado Nogueira Penido apresentou projeto na Câmara e, em 1924, o deputado Basílio de Magalhães insistiu no assunto. A ativista Bertha Lutz e a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF) intensificam campanhas e ações pelo sufrágio feminino.
- 1922 – A FBPF promoveu o Primeiro Congresso Internacional Feminista, nos salões do Automóvel Club, no Rio de Janeiro e recebeu a convidada de honra a sufragista norte-americana Carrie Chapman Catt, que liderou a coalizão de entidades feministas responsáveis pela conquista do voto nos EUA, uma vitória política consagrada na Emenda Constitucional nº 19, transformada em lei naquele país em 26 de agosto de 1920. Catt veio para o Brasil ensinar as sufragistas a como se organizar pelo direito ao voto.
- 1923 – Diva Nolf Nazário, que era advogada, buscou o cartório eleitoral de sua cidade, Batatais (SP), para alistar-se como eleitora e teve o seu pedido rejeitado pelo juiz. Em resposta, publicou a obra Voto feminino e feminismo: um ano de feminismo entre nós, em que a jovem defende a causa da igualdade legal entre homens e mulheres.

- 1927 – O governador Juvenal Lamartine de Faria, do Rio Grande do Norte, apoiava a causa do voto feminino e o Judiciário estadual não se opôs à habilitação de mulheres como eleitoras. Assim, muitas mulheres correram para as sessões eleitorais para alistarem-se.
- Mulheres do Rio Grande do Norte votam pela primeira vez, embora seus votos sejam posteriormente anulados, como Celina Guimarães e Júlia Barbosa.
Entre todos esses projetos, o do senador Justo Chermont foi o que chegou mais longe. No segundo semestre de 1927, o projeto retornou à pauta de discussão no Senado.
- As feministas da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino observaram atentamente esse debate, chegando, inclusive, a acompanhar a sessão da Comissão de Justiça.
- Enviaram cartas aos senadores tentando convencê -los a votar a favor do projeto Chermont e, não satisfeitas, protocolizaram no Senado um abaixo -assinado com cerca de duas mil assinaturas, em dezembro daquele ano.
- A imprensa cobriu a movimentação das feministas e reproduziu os diálogos entre os parlamentares favoráveis e os contrários ao projeto.

Para reforçar a campanha, as feministas da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino foram até Natal para apoiar as novas eleitoras e sobrevoaram a cidade lançando panfletos sufragistas. Existem várias fotos de Bertha Lutz no seu avião.
- 1928 – Mietta Santiago e Alzira Soriano Teixeira tornam-se pioneiras na luta pelos direitos políticos das mulheres, Mietta por ter sido a primeira a conseguir direito de votar e ser votada e Alzira, por ser a primeira prefeita do Brasil.
- 1929 – Adalzira Bittencourt, também advogada, apresentou seu pedido de alistamento em fevereiro. Protocolar pedidos de alistamento em cartórios eleitorais era uma forma comum de manifestar-se politicamente no Brasil e em todos os países que experimentaram campanhas pelo sufrágio feminino. Adalzira também teve seu pedido negado.
Anos 1930: A Conquista do Voto
Em outubro de 1930, um grupo de políticos liderados por Getúlio Vargas chegou ao poder e destituiu o presidente da República Washington Luís.
Vargas deu sinais de que pretendia reformular as leis eleitorais do país e promover eleições para o Legislativo, as feministas da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino e de outras entidades políticas compostas por mulheres procuraram conversar com o então presidente para que, finalmente, o direito de votar fosse estendido às mulheres brasileiras.

- 1931 – Durante o Segundo Congresso Internacional Feminista, o então presidente Getúlio Vargas se mostra simpático ao movimento sufragista, aproximando o Brasil da concessão de direitos políticos às mulheres.
- 1932 – O Decreto 21.076 finalmente é assinado por Getúlio, permitindo que mulheres alfabetizadas e maiores de 21 anos votem. Com exceção das mulheres casadas:
“Apenas as mulheres viúvas ou solteiras com renda própria poderiam votar. As mulheres casadas, mesmo que também tivessem renda própria, fruto de atividade profissional, só poderiam votar se autorizadas pelo marido. A comissão buscava assim impor restrições que, segundo alguns de seus membros, eram indispensáveis à boa ordem das relações privadas na família brasileira”.
Pelo que se tem registro, quem tirou todas as restrições foi Getúlio Vargas após diversas pressões sufragistas.
Foi então que o decreto do novo Código Eleitoral, publicado em 24 de fevereiro de 1932, acolhendo o voto feminino sem condições excepcionais.
As mulheres poderiam votar e ser votadas. Também podiam participar de eleições os religiosos integrantes de ordens, a quem a Constituição de 1891 havia negado a prerrogativa de votar. Por consequência, freiras também poderiam votar, se quisessem. O código também previu um tipo novo de representante, o classista, que podia ser escolhido por empregados ou por empregadores
Com a nova Constituição, o direito de voto é estendido a todas as mulheres alfabetizadas maiores de 18 anos, e, nesse mesmo ano, mulheres são eleitas para a Câmara dos Deputados e Assembleias Estaduais.
- 3 de maio de 1933 – Realizou-se em todo o país a eleição para os representantes na Assembleia Constituinte. Ao todo, sete mulheres candidataram-se à Constituinte, todas pelo Rio de Janeiro: Leolinda Daltro, Natércia da Silveira, Bertha Lutz, Ilka Labarte, Georgina Azevedo Lima, Tereza Rabelo de Macedo e Julita Soares da Gama.
Dessas candidatas, Bertha foi a que recebeu a maior votação: 16.423 votos. Esse número não foi suficiente para assegurar uma cadeira na Câmara, mas Lutz assumiu a primeira suplência do Partido Autonomista.
Porém em julho do mesmo ano, Almerinda de Farias Gama, outra afiliada da FBPF, participou como delegada-eleitora do Sindicato dos Datilógrafos e Taquígrafos do Distrito Federal dos deputados classistas, ou seja, ela estaria na Constituinte representando os sindicatos de trabalhadores, de empregadores e de profissionais liberais.
As mulheres da época somente puderam expressar seu voto em duas ocasiões – em maio de 1933 e em outubro de 1934.
- 1936-1937 – Bertha Lutz toma posse como deputada federal e propõe importantes projetos sociais, como a licença maternidade e paternidade.
Em 1937, no entanto, o Estado Novo decreta a suspensão dos direitos políticos, incluindo o direito de voto, o que interrompe temporariamente as conquistas femininas.
Estado Novo (1937-1945)

O Estado Novo foi uma ditadura chefiada por Getúlio Vargas no Brasil, que começou em 1937 e durou até 1945. Ele deu um golpe de Estado em 10 de novembro de 1937, fechou o Congresso Nacional e instaurou um regime ditatiral.
Ou seja, nada de separação entre poderes, nada de partidos políticos, nada de eleições livres. Era um governo na base da canetada, da censura e da repressão.
Durante o Estado Novo, não houve eleições diretas para presidente, governadores ou deputados. O Congresso foi fechado, e Vargas governou por decretos-leis. Ou seja:
- O direito ao voto foi suspenso para todo mundo: homens, mulheres, jovens, pessoas alfabetizadas (porque na época só quem era alfabetizado podia votar) — geral perdeu esse direito.
- Os cargos políticos passaram a ser nomeados diretamente por Vargas. Era ele quem escolhia os interventores (espécie de “governador nomeado”) nos estados, por exemplo.
- As eleições só voltaram a acontecer em 1945, com o fim do Estado Novo.
Então, o direito das mulheres ao voto ficou congelado junto com o de toda a população brasileira durante os 8 anos da ditadura.
Fim do Estado Novo

Em 1945, movimentos por redemocratização estavam crescendo — inclusive com mulheres organizadas pedindo o direito de continuar votando e sendo votadas.
Em 1946, após a queda do Vargas, foi convocada uma Assembleia Nacional Constituinte (igualzinha a de 1933 que garantiu o voto das mulheres antes), que elaborou uma nova Constituição, promulgada em 18 de setembro de 1946.
Essa Constituição de 1946:
- Restaurou os direitos civis e políticos, inclusive o voto.
- Reafirmou o sufrágio feminino (as mulheres voltaram a votar oficialmente e legalmente).
- Reabriu o Congresso Nacional.
- Autorizou a volta dos partidos políticos.
Porém, o voto ainda era restrito a alfabetizados (então a maioria do povo pobre e racializado seguia excluído).
Mulheres ainda enfrentavam barreiras culturais, políticas e partidárias para serem eleitas. A desigualdade de gênero e classe continuava pesando forte na política.
Anos 50 e 60: resistência tímida, mas crescente
Durante esse período, as mulheres vão ganhando mais acesso à educação e ao mercado de trabalho, principalmente nas cidades. Isso começa a ampliar a participação social — mas ainda não se traduz em massa política.
Tínhamos clubes femininos, associações de mulheres, movimentos católicos e leigos, atuando por direitos sociais, saúde, educação. Mas o feminismo ainda não era uma força política radicalmente organizada.
Faltava o quê? Mobilização coletiva feminista autônoma. E isso só vai vir com mais força nos anos 1970, durante outra ditadura.
Golpe militar (1964-1985)

Em 31 de março de 1964, os militares tomam o poder com apoio das elites, da mídia e dos EUA. Instalam uma ditadura civil-militar que duraria até 1985.
Durante essa nova repressão:
- Os direitos civis e políticos voltaram a ser atacados.
- As organizações femininas foram perseguidas.
- A censura, a tortura e o silenciamento marcaram a atuação de muitas mulheres — mas não apagaram sua resistência.
Mulheres com atuação política (principalmente as de esquerda, comunistas, sindicalistas, feministas) foram perseguidas, presas, torturadas e exiladas.
A representação parlamentar feminina foi quase nula:
- Na Câmara dos Deputados, de 1964 a 1974, nunca houve mais de 3 mulheres eleitas em um universo de mais de 400 deputados.
- No Senado, nenhuma mulher ocupava vaga até 1976.
Na surdina, mulheres criam jornais feministas como “Brasil Mulher”, “Nós Mulheres”, “Mulherio”, fundam grupos de consciência feminista, participam de partidos clandestinos, denunciam a violência de Estado, e começam a pautar o feminismo como movimento político anticapitalista e estruturado.
Essa movimentação vai ser crucial para a redemocratização nos anos 1980 e pra participação das mulheres na Constituinte de 1988.
Em 1975, a Organização das Nações Unidas (ONU) proclamou o Ano Internacional da Mulher, o que ajudou a dar visibilidade para o movimento feminista no Brasil, levando a organizações como o Movimento Feminino pela Anistia a pautar a luta das mulheres.
Em 1976, Eunice Michilles assume uma vaga como suplente de senador pelo estado do Amazonas. Ou seja: ela não foi eleita diretamente, substituiu o titular que faleceu. Virando a primeira senadora do brasil, pelo Arena, partido que defendia a ditadura.
Nesse contexto, começam a surgir grupos de mulheres que vão se organizar de forma autônoma, distantes de partidos políticos. Esses grupos tinham foco em direitos civis, liberdade sexual, direito ao aborto e políticas públicas voltadas para a saúde da mulher.
Movimentos como o da “segunda onda do feminismo” (influenciados pelas lutas feministas de outros países, principalmente os EUA e a Europa) começam a surgir no Brasil, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT), que teve atuação importante na formação do movimento feminista popular.
Em 1979, com o fim do AI-5 (Ato Institucional nº 5), o Brasil começa a ter uma abertura política, mas o regime militar continua com o processo de distensão — ou seja, com a ideia de dar um ar de normalidade política, mas sem devolver o controle real ao povo.
Mesmo com essa distensão, as mulheres continuavam a ser silenciadas no campo político formal.
O processo de repressão tinha levado muitas mulheres militantes para o exílio ou as tinha torturado durante os anos anteriores.
1985-1986: A redemocratização e o Lobby do Batom

Com a anistia e o fim da ditadura, o Brasil começa a viver um período de transição para a democracia.
- 1985: Fim da ditadura e a volta do governo civil com a eleição indireta de Tancredo Neves (que morre antes de assumir) e a posse de seu vice, José Sarney.
- 1986: O governo Sarney realiza uma Campanha das Diretas Já em favor de eleições diretas para presidente — mas, enquanto isso, as mulheres começam a pressionar por direitos mais sólidos.
O que é interessante nesse período:
- As mulheres começam a se organizar mais diretamente para garantir sua participação nas discussões sobre a nova Constituição, que seria uma espécie de “salvaguarda” da democracia que estava sendo restaurada.
- Lobby do batom: Em 1986, o chamado “lobby do batom” é criado, um movimento de mulheres empresárias, líderes e representantes de diferentes setores da sociedade que pressionam pela inclusão de pautas feministas na nova constituição.
Esse lobby tem o objetivo de garantir que as mulheres tivessem uma representatividade política efetiva nas discussões constitucionais, já que as mulheres estavam sub-representadas tanto nas instâncias de poder quanto em cargos de decisão política.
Constituição de 1988: um marco de conquista, mas com desafios

Após a transição política, em 1987-1988, os feminismos se mobilizam de forma muito mais estruturada para incluir direitos das mulheres na nova Constituição. O que ocorre?
As mulheres do Lobby do Batom ganham espaço na elaboração da nova Constituição.
- A Constituição de 1988 trouxe um conjunto de avanços em relação aos direitos das mulheres, especialmente no que diz respeito à igualdade de direitos, direitos reprodutivos e proteção contra a violência doméstica.
- No entanto, as questões sobre aborto e outros direitos não foram totalmente garantidas, em parte por conta da forte oposição da Igreja Católica, da direita conservadora e da pressão das mulheres do lobby do batom, que não conseguiram avançar na questão do aborto seguro, por exemplo.
O resultado foi uma Constituição com avanços, mas também retrocessos.
A Constituição de 1988 garantiu a licença-maternidade de 120 dias, estabeleceu uma proteção à mulher contra a violência doméstica (embora não tão aprofundada quanto seria necessário), e reforçou as normas de igualdade salarial.
Foi garantido o direito à saúde e à educação para as mulheres e também o direito ao trabalho sem discriminação.
Anos 2000
Nos anos 2000, a representação feminina na política começa a aumentar, e as mulheres ganham espaço em cargos de poder. Aqui estão os destaques:
Em 2010, com a eleição de Dilma Rousseff para a Casa Civil, e a presidência de 2011-2016, as mulheres ganharam um espaço inédito. Ela foi a primeira mulher presidente do Brasil e colocou as pautas feministas e contra a ditadura mais no centro do debate nacional.
Décadas de mobilização culminaram em uma conquista histórica para as mulheres brasileiras, que ganharam o direito de votar e ser votadas, marcando um avanço fundamental para a igualdade de direitos no Brasil.
Cada etapa dessa trajetória simboliza a perseverança e a força das mulheres que, ao longo da história, se dedicaram a transformar a sociedade.
Aas mulheres no Brasil conquistaram direitos fundamentais, mas enfrentaram também uma série de retrocessos, especialmente em relação a direitos reprodutivos, políticas públicas de proteção contra a violência e representatividade política.
O caminho não é fácil, mas o movimento feminista no Brasil continua sendo um motor de transformação, desafiando barreiras e lutando por igualdade real.
Como você vê, o movimento nunca é linear, mas sempre é potente!
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